A mastite continua a ser uma das doenças mais dispendiosas no setor leiteiro, responsável por perdas económicas significativas na indústria leiteira mundial, sobretudo ao afetar a qualidade e a quantidade total de leite. O seu impacto económico também se deve ao leite descartado, à eliminação dos animais afetados, aos custos adicionais de tratamento e aos custos de trabalho extra.

A mastite é a inflamação da glândula mamária causada principalmente por uma infeção Intra mamária (IMI). A nível mundial, a maioria dos casos é de origem bacteriana, provocada por espécies como Staphylococcus aureus, Streptococcus dysgalactiae (S. dysgalactiae), S. agalactiae, S. uberis e Escherichia coli2. Para além da exposição a patógenos, a incidência da doença também depende da eficácia dos mecanismos de defesa do úbere e da presença de fatores de risco ambientais.

A mastite pode ser classificada como clínica ou subclínica, dependendo da presença e da magnitude dos sinais clínicos. A mastite subclínica (MS) apresenta uma incidência maior do que a forma clínica (a mastite MS é 15 a 40 vezes mais frequente em comparação com a forma clínica).2

A mastite clínica pode ser detetada facilmente, com base na presença de secreções lácteas anormais e na avaliação da simetria dos tetos e do úbere. De acordo com a gravidade, classifica-se em leve (anomalias no leite), moderada (anomalias no leite e no quarto mamário, com até 6 parâmetros de alteração do quarto), e grave (anomalia no leite, sinais de doença sistémica com ou sem alterações nos quartos mamários).3

Na mastite subclínica não se observam anomalias visíveis na glândula mamária nem no leite, e a sua deteção baseia-se na contagem de células somáticas. Dada a sua maior incidência em comparação com a mastite clínica e a falta de alterações visíveis no leite, a deteção precoce através de ferramentas de diagnóstico eficazes é crucial para o isolamento das vacas infetadas e, consequentemente, prevenir a propagação da doença para as saudáveis.

Foram avaliados diversos e distintos testes para o diagnóstico de mastite subclínica. De seguida, apresenta-se uma breve descrição dos métodos mais utilizados para diagnosticar a mastite, assim como dos que se encontram atualmente em desenvolvimento e investigação.

Métodos de Referência – Indicadores de Inflamação

Contagem de células somáticas (CCS) e contagem diferencial de células somáticas (CDCS): métodos de laboratório e em vacas

A mastite provoca um aumento das células somáticas no leite [principalmente linfócitos, macrófagos e neutrófilos polimorfonucleares (PMN)] e uma alteração da composição do leite. A contagem de células somáticas (CCS) é a quantidade de células somáticas por mililitro de leite que indica a resposta inflamatória na glândula mamária. Em associação com a cultura bacteriana, a CCS ajuda a identificar e monitorizar a IMI e a qualidade do leite ao nível de quarto, vaca, rebanho e população. Atualmente, a forma mais prática e sustentável de gerir a saúde do úbere nos rebanhos leiteiros é através da monitorização individual da CCS.

Pode ser medida em laboratório através da microscopia direta de células somáticas, o que exige um microscópio de alta qualidade e a formação do pessoal, ou por meio da utilização de contadores celulares eletrónicos automatizados, que se baseiam em métodos de citometria de fluxo, proporcionando uma medição precisa, rápida e exata.

Em geral, em condições de campo, considera-se que um nível de 200.000 células/ml em amostras compostas (leite dos quatro quartos) é o limite que identifica a mastite subclínica. No entanto, já foram observadas alterações na composição do leite mesmo abaixo de 100.000 células/ml.4

A contagem diferencial de células somáticas (CDCS) é um conceito mais recente que se define como a proporção combinada de PMN e linfócitos dentro da contagem total de células somáticas (CCS). A combinação da CDCS com a CCS oferece uma nova abordagem para identificar a mastite. A CDCS é realizada habitualmente por microscopia e citometria de fluxo, mas ambas as técnicas apresentam limitações para a sua aplicação fora do âmbito da investigação. Recentemente, foi desenvolvido um analisador que permite a análise rotineira tanto da CDCS como da CCS utilizando amostras individuais de leite de vaca não tratadas de forma rentável e fiável.5

Os métodos mais comuns na exploração para estimar o CCS do lado da vaca são o teste de mastite californiano (CMT), o teste de mastite de Wisconsin (WMT) e o teste de atividade da esterase.

O CMT é o teste de campo mais utilizado em vacas de leite para a medição indireta da CCS no leite. Consiste na adição de um reagente ao leite que precipita o ADN das células, criando um gel que pode ser corado utilizando um indicador de pH. A alteração da viscosidade na formação do gel é medida para fornecer uma indicação do número de células. É relativamente barato e rápido, embora tenha baixa sensibilidade e especificidade. Quando as IMI são causadas por patógenos importantes, continua a ser uma ferramenta de deteção útil.6

O WMT é uma modificação do CMT desenvolvida para aumentar a objetividade da medição da viscosidade. Também foi desenvolvido um WMT modificado para utilização em laboratório.

OUTROS INDICADORES DE INFLAMAÇÃO

A mastite altera a composição do leite e algumas dessas alterações são potencialmente úteis para detetar a mastite. As principais alterações no úbere incluem a perda de iões, proteínas e enzimas do sangue para o leite devido a uma maior permeabilidade, a invasão de células fagocíticas para o compartimento do leite e uma menor concentração de certos componentes do leite. O quarto afetado também pode produzir substâncias relacionadas com a reação inflamatória, como as proteínas de fase aguda. De seguida, são enumerados alguns dos biomarcadores e testes habituais:

Condutividade elétrica (CE)
É o indicador mais utilizado para o acompanhamento em linha da saúde do úbere, pois é muito simples e rápido. A mastite altera a concentração de iões no leite com mastite, provocando um aumento da CE acima do seu valor normal de aproximadamente 4,6 mS/cm.8

Marcadores bioquímicos
Existem vários testes disponíveis para detetar a mastite subclínica, que incluem diversas substâncias metabólicas como lactose, proteínas e enzimas, que são marcadores bioquímicos que se podem alterar durante a mastite subclínica.6

  • Lactose: a concentração de lactose no leite com mastite é baixa devido ao dano tecidual.
  • Lactato desidrogenase (LDH) é libertado no leite quando ocorre dano celular nas células epiteliais mamárias ou nos leucócitos.
  • N-acetil-β-D-glucosaminidase (NAGasa) é uma enzima lisossómica que é libertada no leite a partir das células epiteliais mamárias danificadas.
  • Proteínas de fase aguda, como a haptoglobina e o amiloide A do leite, que migram do sangue para o leite devido ao aumento da permeabilidade capilar ou através da produção local por parte dos leucócitos do leite ou das células epiteliais mamárias.

Sensores ultrassónicos e eletromagnéticos

A espectroscopia no infravermelho médio (MIR) é frequentemente utilizada para analisar gorduras, proteínas e lactose com grande precisão e repetibilidade, tanto em laboratório como com um dispositivo portátil na exploração agrícola, mas não é adequada para analisar o leite em sistemas em linha. A espectroscopia no infravermelho próximo (NIR) é menos precisa, mas permite a sua utilização online e fornece informação em tempo real. Por outro lado, a espectroscopia no espectro visível pode ser utilizada para detetar alterações na coloração do leite.8

Biossensores e nanotecnologia

Recentemente, a nanotecnologia e os métodos de diagnóstico baseados em biossensores têm sido cada vez mais utilizados no diagnóstico de diversos patógenos causadores de mastite.2,9

Sensores químicos

Alguns projetos experimentais foram desenvolvidos para detetar determinadas doenças em que se produzem metabolitos voláteis característicos. Uma das aplicações poderia ser a deteção de leite de vacas com mastite clínica aguda.8

OUTROS MÉTODOS

Termografia infravermelha
A termografia infravermelha (TIR) é uma tecnologia sofisticada baseada no princípio de que todos os objetos emitem radiação infravermelha proporcional à sua temperatura. Vários estudos demonstraram que a termografia é uma técnica suficientemente sensível e não invasiva para detetar alterações térmicas na pele do úbere causadas por mastites subclínicas. No entanto, são necessários mais estudos para investigar certos fatores que podem afetar esta técnica.10

Métodos basados na proteómica
Estão a ser desenvolvidos métodos baseados na proteómica para uma identificação rápida, sensível e precisa de patógenos. Os marcadores proteicos presentes no soro da vaca durante a fase subclínica da mastite poderiam ser utilizados no diagnóstico baseado na proteómica.9 Têm sido avaliadas estratégias como a espectrometria de massas MALDI-TOF como métodos alternativos para a identificação em grande escala de bactérias a partir de amostras de leite de animais leiteiros com maior especificidade e sensibilidade que o método clássico.2

Diagnóstico de patógenos causadores de mastite

Técnicas de cultura bacteriana
A cultura do leite proveniente do tanque de armazenamento, de um quarto ou vaca individual, de grupos ou categorias de vacas, acrescenta uma dimensão adicional à avaliação da saúde do úbere e aos programas de controlo de mastite, especialmente quando essa informação é combinada com a contagem de células somáticas. No entanto, as técnicas de cultura bacteriana necessitam de métodos padronizados e reprodutíveis para a sua aplicação generalizada.

A maioria dos patógenos cresce facilmente em meio de agar em condições aeróbicas, mas alguns microrganismos, como Mycoplasma spp., necessitam de meios de cultura específicos. As técnicas de cultivo têm uma sensibilidade limitada, que é ainda mais restrita porque exigem o isolamento de uma unidade formadora de colónias (UFC) do patógeno a partir de 0,01 ml de leite (100 UFC/ml). A recomendação geral para considerar que uma amostra de um único quarto é positiva para uma IMI é utilizar 100 UFC/ml, enquanto para os estafilococos não aureus é de 200 UFC/ml.2

Técnicas baseadas em PCR
A alta especificidade e sensibilidade do PCR tornaram-no muito adequado para o diagnóstico de mastite. Existem diversas provas utilizadas para a deteção precoce de mastite, tanto em condições de campo como em laboratório, para identificar patógenos infeciosos que são difíceis de isolar, como Mycoplasma spp. Alguns kits disponíveis quantificam o ADN da bactéria com uma sensibilidade de 100% e uma especificidade de 99-100%. No entanto, os métodos de PCR também podem dar resultados falso-positivos e não distinguem entre bactérias viáveis e não viáveis. Por isso, os resultados do PCR devem ser usados em combinação com outras informações, como a história da mastite, a inspeção do úbere e o CCS.2

 

BIBLIOGRAFIA

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  • 3 Narváez-Semanate, José & Daza Bolaños, Carmen Alicia & Valencia-Hoyos, Carlos & Hurtado-Garzón, Diego & Acosta-Jurado, Diana. Métodos de diagnóstico de mastitis subclínica en leche bovina: una visión general. Revista Facultad Nacional de Agronomía Medellín. 2022; 75. 10077-10088.
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